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		A cada descoberta de novas potencialidades dos 
		vegetais de Cornos, a bolsa fervia, o mundo se agitava. Dos pequenos aos 
		grandes investidores, todos sonhavam enriquecer do dia para a noite com 
		novas descobertas vindas de Cornos. Empresas surgiam e sumiam com a 
		mesma rapidez. Era uma verdadeira revolução econômica. E tudo isso 
		apenas em troca de educar e “civilizar” pouco mais de mil indivíduos. 
		  
		
		Parte da riqueza 
		obtida pelos exploradores de todas as áreas em Cornos, ia para o próprio 
		planeta, que possuía um subgoverno internacional e, inclusive, para o 
		que os terráqueos apelidaram de “área neutra”, onde viviam as tribos e, 
		agora, oficiais da frota, cientistas e professores. Réa logo viu-se 
		administrando uma fortuna considerável e não faltavam recursos para o 
		que quer que fosse preciso construir ou estabelecer nas aldeias e 
		imediações. 
		  
		
		Cornos tinham assim uma 
		qualidade de vida muito superior à maioria dos países da Terra. Todas as 
		suas necessidades básicas estavam supridas e todos os seus caprichos de 
		consumo estavam ao alcance do poder aquisitivo de seus vale-escola.  
		 
		Certa manhã, depois de mais um sonho angustiante com Tutôr, Réa abriu 
		seu computador preparando-se para um dia de rotina administrativa e a 
		tela a avisou que havia uma notícia, reproduzida pelos principais 
		veículos de comunicação da Terra, em que ela e o planeta eram os 
		principais assuntos. 
		Mal pode crer no que seus olhos viram, quando mandou abrir a notícia. 
		
		 
		Apolo, o general que ela derrotara na luta pelo almirantado, fazia 
		sérias críticas à sua administração da área neutra e também à sua 
		atuação no Conselho Consultivo do subgoverno da Terra em Cornos. Ele 
		dizia, entre outras coisas, que os percentuais recebidos pelo subgoverno 
		para administrar a colônia e pela área neutra eram absurdamente altos, 
		que estavam criando, no planeta, uma sociedade muito mais rica do que a 
		própria terra. Atacava duramente o processo de educação e assimilação 
		dos cornianos chamando-os de “povo eleito”, clamando contra os 
		privilégios que colonos e nativos tinham diante da real situação da 
		absoluta maioria dos povos da Terra. Propunha que o Congresso 
		Internacional revisse as leis que regiam as relações econômicas em 
		Cornos e que se fizesse uma devassa na administração do planeta. Sua 
		fúria era principalmente dirigida ao Almirante Réa, que, segundo ele, 
		tratava os nativos como garotinhos mimados, que tinham tudo de mão 
		beijada e previa que as próximas gerações de cornianos, acostumadas a 
		ter tudo sem precisar se esforçar para nada, resultasse num bando de 
		indolentes, que não necessitam ganhar a vida com o suor do próprio 
		rosto. Propunha, ainda, que se estabelecesse moeda real no planeta e que 
		se designassem atividades produtivas para os Cornianos e que estes, 
		afinal, se acostumassem com as regras de sobrevivência no mundo 
		capitalista, uma vez que já tinham se acostumado – e rapidamente – a 
		usufruir do que a humanidade lutara por milênios para conquistar. 
		Referia-se à situação como O Mundo de Mamãe Réa e Seus Tutelados 
		Malandros do Paraíso. 
		
		 
		Réa mal podia acreditar que um general, da importância de Apolo, tivesse 
		se referido ao trabalho de oficial de patente superior com tal descaso e 
		ironia ferina. Pediu uma ligação para o seu tio, irmão de sua mãe, que 
		era Ministro das Relações Espaciais Exteriores (cargo este que, até a 
		descoberta de Cornos tinha sido pouco mais do que uma teoria) e também 
		uma reunião com o alto comando da frota. Imagine, que afronta! Um 
		subordinado não só contestando o trabalho da corporação e as decisões do 
		mais alto comando da frota e dos Cinco Grandes como também se dando o 
		direito de falar de um almirante naqueles termos baixos e pejorativos! 
		Aliás, uma almirante, do sexo feminino... Porque, pensava Réa, se ela 
		fosse um homem ele não teria coragem de atacá-la naqueles termos. Apolo 
		era um velho decrépito, nascido numa cultura ainda profundamente 
		machista, pois era ele no começo do século XX e já estava com 136 anos 
		de idade.  
		
		  
		- Ministro, meu querido tio – disse ela, quando a conexão foi 
		estabelecida – eu apenas queria deixar claro que estamos, no subgoverno, 
		conduzindo a colonização de Cornos conforme o que foi acordado 
		internacionalmente na Conferência da Vênus Platinada e que, 
		particularmente, tenho governado a área neutra também segundo os mesmos 
		princípios. 
		
		 
		O ministro era conhecido por seu bom humor. Era mesmo um tipo bonachão e 
		caiu na risada, seus olhos brilharam e Réa, ante a imagem dele na tela, 
		sentiu-se ridícula. 
		
		 
		- Apolo conseguiu finalmente uma pequena vingança contra a Almirante Réa, 
		hein? Não se importe com isso, minha filha. Cornos é um sucesso, a terra 
		ficou mais rica com o trabalho de vocês, todos apóiam e está tudo certo. 
		Mas, convenhamos, alguma oposição é sempre necessária e pode fazer o 
		Congresso Mundial refletir sobre os rumos que se traçarão para o planeta 
		daqui para frente. 
		
		 
		Era incrível! Ele não só a tratava como se ela fosse uma colegial 
		ofendida como achava bom que o Congresso repensasse as diretrizes para a 
		colônia. Sentiu seu rosto avermelhar-se e esperou que o ministro não 
		pudesse, pela tela, perceber o seu rubor: 
		- De qualquer maneira eu reafirmo que estamos conduzindo as atividades 
		da colonização em Cornos dentro dos parâmetros que nos foram 
		estabelecidos. 
		
		 
		- Eu não poderia esperar outra coisa de você, minha cara Almirante e 
		sobrinha. Não se preocupe com a velha raposa do Apolo. Deixe que ele 
		espume a sua raiva pela boca. Na verdade, ele está morrendo de inveja de 
		você. É bom ir se acostumando a isso, Almirante. Tenha um bom dia. 
		E desligou. 
		
		 
		Quem espumava agora era Réa, de raiva e por estar arrependida de ter 
		incomodado um ministro, ainda que fosse seu tio, com uma questão que ela 
		deveria ter deixado passar despercebida. Dera importância demais a 
		Apolo. Precipitara-se e merecia ser tratada como uma colegial. Logo ela, 
		sempre tão ponderada em suas decisões. 
		A reunião com o comando, dois dias depois, não foi melhor. Eles julgaram 
		que Apolo, embora sendo um membro da corporação, tinha todo o direito de 
		fazer suas críticas e muitos eram mesmo favoráveis a vários pontos de 
		vista do general. O máximo que ela conseguiu foi uma advertência formal 
		ao general quanto à rispidez de suas palavras com relação a um superior 
		hierárquico. 
		 
		Sentindo-se tola, solitária e criança, naquela noite, quando voltou da 
		Terra ao planeta e deitou-se em sua confortável cama, fitou as estrelas 
		do firmamento de Cornos e pensou que gostaria de ter ao seu lado naquele 
		momento os braços fortes do companheiro para envolver seu corpo cansado. 
		Mas, estranhamente, não era a imagem de Narciso que ocupava seus 
		pensamentos. Os braços imaginários eram os braços de Tutôr.  
		Desacostumada às críticas, ela que em toda a sua vida só colecionara 
		sucessos, sentia-se extremamente só naquele momento. 
		  
		
		O tempo, porém, provaria que Apolo não estava totalmente errado. 
  
		
		Próximo capítulo -
		
		11 - A Árvore do Conhecimento 
		  
		
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