troncos
e galhos. Outras são mutiladas por funcionários de dezenas de companhias
que precisam passar seus milhares de cabos antiestéticos pelos postes
das ruas e, consequentemente, entre os galhos das árvores. Podadas sem
qualquer técnica, elas se desequilibram, um vento mais forte as derruba.
Sonho com a ocupação do subsolo, não pelos piscinões, mas sim pelos
cabos, como é aqui na Paulista. Nada de milhares de cabos se amontoando
e enfeiando as ruas, pelos postes. Há dez anos fui parada por um
repórter de TV que perguntava aos transeuntes se deveríamos enterrar os
cabos.
-- É claro – respondi.
E ele:
-- Mas levaria 10 anos.
E eu: --
E daí? Se começarmos agora, daqui a 10 anos estará pronto.
Ninguém começou, porque nenhum prefeito colherá os louros de uma batalha
que só será vencida dali a uma década.
Sonho com a ocupação de todas as calçadas da cidade por árvores e mais
árvores. Sonho com grandes condomínios que, além de grandes casas e/ou
grandes prédios tenham também grandes árvores.
Isaac Asimov, um dos mestres da literatura de ficção científica, certa
vez esteve numa feira de inventores nos EUA e viu um sujeito que criara
uma máquina de despoluir o ar. O escritor disse a ele:
-- Ué! Pra que isso? Já temos as árvores.
Árvores são máquinas de despoluir o ar. Árvores são refrescantes e
combatem o calor excessivo, assim como seguram parte da chuva em seus
galhos e folhas.
Nosso prefeito, Bruno Covas, disse ontem em coletiva de imprensa: as
medidas preventivas que a administração municipal vem adotando, como o
maior cuidado com as árvores e a limpeza dos piscinões, evitaram que a
tragédia fosse ainda maior.
Vivemos, esse 10 de fevereiro, sob a mais forte chuva registrada, nesse
mês, em 37 anos. Foi exatamente nos anos 1980 que escrevi a minhas
indignadas crônicas sobre a cidade espetacular, progressista,
trabalhadora, que parava por causa da água que o céu nos mandava.
Não pensei que, quatro décadas depois, ainda estaria escrevendo a mesma
coisa, com a mesma indignação.
Colégios sem aula, rodízio suspenso, mercadorias e alimentos perdidos em
feiras, casas, centrais de abastecimento. Um homem de 33 anos, morto,
arrastado pela enxurrada. Horas e horas estancadas no trânsito.
Transporte coletivo caótico, trens imobilizados. Famílias perdendo bens,
móveis, roupas, eletrodomésticos e o grande saldo da sujeira, sujeira
nas ruas, nas casas, nas lojas, nas praças, em todo o lugar.
Assim como precisamos de árvores, precisamos de educação, cidadania,
espírito de coletividade. Somos todos interdependentes, não apenas uns
dos outros, mas de toda a Mãe Natureza. Somos irmãos de tudo o que está
vivo sobre o planeta.
Infelizmente, a maioria não se dá conta disso. Uns poucos é que têm que
lutar com afinco para impedir que esse Aquecimento Global prossiga
matando flora, fauna e humanos também.
A elevação do nível dos oceanos mostra sua cara no enorme iceberg – do
tamanho da cidade de São Paulo, 1500 km2 – que se desprendeu e vem
flutuando à solta pelo mar e mostra sua cara nas casas à beira mar, que
desabam, porque a praia sumiu, coberta pela água que subiu seu nível, no
nordeste brasileiro. Em Berlim, 2019 não teve neve e a temperatura ficou
apenas 2 graus abaixo de zero. Em Paris e Roma, nos últimos verões, os
europeus – que outrora viajavam aos países tropicais para saber o que é
calor – derretem sob condições meteorológicas antes impensáveis para
essas cidades, beirando os 40 graus à sombra em verões escaldantes.
Tempestades, terremotos, tsunamis, ciclones, furacões, tornados, cada
vez mais fortes e frequentes são anunciados pela maior parte da mídia
mundial como “desastres naturais” coisa que já foram um dia. Hoje não
são mais. Hoje são desastres artificialmente incrementados pela ação
humana sobre o planeta, pela destruição do verde, pela poluição do ar,
pelo desmatamento constante e mercenário.
Sou apenas uma jardineira de apartamento, em constante comunhão com a
Natureza, através das minhas humildes plantinhas.
Mas a menina Greta fala por mim, fala por muitos.
Quando nossos descendentes perceberem que o tal do progresso transformou
a terra em um lugar inabitável, talvez ainda haja uma chance de
retroceder e de reconquistar o respeito que devemos à toda a vida que
aqui, conosco, habita.
Deus salve as árvores.
Isabel Fomm 2020 02 11 |