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Inverno Solar Idade Não é Sinônimo de Doença. por Dra. Stela Maris Grespan |
No final de semana tivemos em Sampa o Congresso Brasileiro de Cardiogeriatria. Para mim é uma experiência quase psicanalítica no sentido de que suscita reflexões e emoções por muito tempo.
Sou um tipo que rememoro o
aprendizado do novo, volto no tempo, relembro e comparo conceitos,
pondero, coloco dúvidas onde pressinto a conclusão apressada da certeza. No geral saio contente. Revejo velhos parceiros em plena atividade e o respeito às suas experiências. Conheço jovens homens e muitas mulheres pela trilha que abrimos há cerca de 30 anos. |
Primeiro como grupo de estudo, depois como um departamento da sociedade brasileira de cardiologia. Não é uma especialidade, mas área de atuação.
Lá pelo final dos anos oitenta, início dos noventa, os brasileiros começaram a superar a linha de chegada que era a de 62 anos para atingir uma expectativa de vida de 68 anos. O envelhecimento populacional gradativo era uma realidade nas ruas, nas famílias, consultórios e ambulatórios médicos. Realidade desafiadora, pois este grupo pioneiro começou a reconhecer, em vida e não nos estudos pós mortem, que idade não era sinônimo de doença.
Que era um grupo heterogêneo por definição e que resistia ao reducionismo de atributos pejorativos e paralisantes. Corpos idosos podiam ter rugas, flacidez, mas seus órgãos tanto podiam responder com a mesma vitalidade da juventude, quanto expressar quedas de gravidade variáveis em sua reserva funcional. Afora a genética, não menos importante era o estilo de vida, a natureza do trabalho, o nível educacional, o status social, as opções feitas, os maus hábitos na determinação das diferenças observadas. Chegar à velhice era ostentar a somatória das experiências físicas ou mentais positivas e negativas de cada um no seu viver. A isto estamos nos dedicando, procurando entender os processos cronico/ degenerativos que acometem um maior número de idosos e suas particularidades individuais.
- a
democratização do acesso ao serviços de saúde em todos os seus braços de
prevenção, diagnóstico, tratamento clínico, cirúrgico e de reabilitação
funcional assegurou a parte expressiva da população, então
marginalizada, o direito à longevidade. O direito universal à saúde é
primordial para a luta contra a desigualdade neste país com triste
herança colonial e escravagista. -
justamente no reconhecimento das diferenças nos caminhos do viver, nas
bagagens inevitáveis das doenças que se agregam e são chamadas de
comorbidades, há que ajustar o foco continuamente. Há o momento em que a
prudência e a sabedoria devem desistir de tratamentos heroicos e cuidar
de emprestar vida aos anos que nos restam. O caminho para a igualdade no
acesso aos tratamentos domiciliares e de paliação ( que é uma forma de
tratamento ativo, de cuidado, de promoção de alívio e dignidade para com
o paciente e seus familiares) pelo SUS e alguns seguros privados, ainda
está longe e anda de gatinhas. Alguns hospitais de ponta no Brasil
criaram grupos para influenciar, dar sua expertise na criação destes
tratamentos no SUS. São poucos. Há que pressionar os órgãos responsáveis
para que esta situação se modifique e rapidamente. - há que
envolver os profissionais da saúde como um todo na questão da paliação,
da finitude, única certeza num universo de incertezas. E abrir a
discussão com a sociedade, com nossas famílias, as famílias dos
pacientes, deixar a negação equivocada e preparar a despedida de modo a
emprestar-lhe o merecido brilho. - há que
aprender a viver o tempo em que podemos ser mais livres para realizar os
sonhos que não tivemos oportunidade de realizar, distraídos que
estávamos, lutando pela nossa sobrevivência material, de filhos ou
outros dependentes. Viver um inverno solar, coerente, afetuoso, com
amigos e interesses, de gratificações não egoísticas, livre dos adereços
desnecessários e falsos. - estar
envelhecendo junto com os meus pacientes é um dos meus motivos de
alegria. Estamos mais iguais a cada dia e penso nos versos do Gil: |