(Van Gogh, 1899, Paisagem ao Nascer da Lua)
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Blue Moon no Cerrado
por Stela Maris Grespan |
A casa ficava no alto do morro e vista da rua, sua fachada não chamaria a atenção não fora pelo caramanchão de flores da estação. Seu ponto alto, para mim, se escondia aos olhos do visitante passageiro, na varanda aberta a um quintal de boas dimensões.
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Pairava uma paz e
serenidade intangíveis no ar fresco da hora pré-crepuscular que nos
tocava em um sentido ainda não descrito. Um leve aroma de limões
incensava o ambiente, vindo do jardim. Os pássaros silenciaram. Mafalda,
bela pastora de gentes, cansada da busca por calangos, já se deitara aos
nossos pés e alongara o seu focinho, a farejar o fim do dia. Também a
coruja, em sua visita sistemática, ocupara o mourão que dividia o
terreno. Seus olhos argutos, ora nos fixavam, ora perscrutavam o mato
crescido do declive profundo que descortinava o vale, assim nos
permitindo ver, ao longe, a suave ondulação da cadeia de morros verdes,
pontuada por casas tenuemente entrevistas em meio às árvores.
As cores róseas e
alaranjadas foram mansamente assumindo os tons azuis da paleta de um Van
Gogh soberano; uma ou outra estrela, se viva ou morta pouco importa, já
brilhavam num céu que se fizera azul profundo. As luzes nos morros foram
se acendendo e eu sentia-me presa como num encantamento infantil de um
imenso presépio.
Havíamos levantado em
silêncio e, olhando para o alto e à esquerda ( sem metáfora), pude ver
pela vez primeira uma imensa lua vestida de azul, a tão esperada blue
moon, com sua luz a iluminar o mistério do mundo. O tempo parou...
- E daí, mãe, vamos
jantar?
E, à sua voz, como disse Pessoa, o universo
reconstruiu-se-me, sem magia eu diria, não fosse o sorriso de Isadora. Brasilia, em algum tempo. |