(Comandante Pullin, Paulistinha sobre Ilha Porchat e Itararé) |
Terceira Classe por Dra. Stela Maris Grespan
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Nem todos apreciam histórias de viagens que não sejam as suas. E eu
respeito. Assim como ver as fotos de lugares que só fazem parte de
nossas memórias. Há anos evito mostrá-las pois percebia um indisfarçável
bocejo de tédio.
Uma viagem é uma aventura muito particular de
descobertas, aprendizado e quero crer que, ainda hoje, me revigora e
modifica. Estamos sempre aprendendo. |
Até não faz muito, só cruzávamos o Atlântico em longas viagens de navio, havendo até quem levasse seu carro à bordo. Parece que foi ontem que o Caravelle da VARIG decolou para Paris, inaugurando uma nova era para a aviação comercial no país. Como sempre, só para alguns mais endinheirados. As pessoas vestiam-se com apuro, como para um evento social. Imagino o massacre após doze horas de desconforto. Serviço de bordo impecável, bebidas alcoólicas e comidas à vontade, servidos em pratos de porcelana e talheres de prata ou inox foram, gradativamente, dando lugar ao plástico, dado o número de talheres roubados.
Um dia,
voando para Fortaleza, sentou- se ao meu lado uma senhora, adentrada em
anos, advogada. Empilhou todas as nossas bandejas, antes de entrega-las
à aeromoça, visivelmente constrangida, para disfarçar o roubo de
talheres. Ciciou-me, depois, que já tinha um faqueiro completo! O
glamour também incluía estas comissárias de bordo! Todas jovens, lindas,
escolhidas a dedo, uma profissão de fantasia para muitas. Eu, mesmo que
quisesse, já estava previamente barrada pela altura exigida- 1,65 m. E foi
ficando cada vez mais confortável e barato fazer uma curta viagem de
1:20 minutos de Porto Alegre a São Paulo do que enfrentar 18 horas de
estrada, muitas precárias e perigosas. E o
mundo foi ficando mais pequeno, mais acessível a uma classe média que
ansiava por conhecer as maravilhas das grandes capitais europeias e
americanas. Hoje em
dia, em aeroportos imensos, nos deslocamos de trem até nosso portão.
Cada vez mais cansativo com a exigência de chegada três horas antes do
embarque, mesmo com check-in on-line que, somadas a uma hora para
alfândega no aeroporto de destino, pode prolongar uma viagem de quinze
horas para até 20 horas. Constatações, não reclamações, pois sou grata
pelo privilégio de poder viajar. Toda
esta conversa, para chegar ao ponto nevrálgico da questão. Os voos
atuais, em super aeronaves, possibilitam que mais de 400 passageiros
realizem os seus sonhos de aventura. Para alguns, à semelhança da
divisão por classes sociais vigentes no mundo, de forma mais prazerosa
do que para outros. A primeira classe e a executiva são separadas de
forma gritante dos passageiros da econômica (para não dizer de segunda
classe) e na qual me enquadro. Entram e saem em primeiro lugar, de forma
discreta. Alguns aviões dispõem de um segundo andar, onde é possível
viajar em suítes, ao preço escandaloso de 25000 reais. Enquanto isto, na
econômica, somos distribuídos por grupos A, B, C... para ingressar no
avião. Uma logística para ocupação do espaço, uso de maleiros, etc...
muito compreensível. Há que ordenar a massa, não é mesmo? Retornando agora de Dubai, pela Emirates, sofrendo antecipadamente por meus joelhos na expectativa de um longo voo, embora bem colocada em assento, recebo o cartão de embarque no grupo E, o último. Formou-se um grupo de uma espera que nos parecia infindável, constituído exclusivamente por brasileiros. Quando o funcionário, finalmente, deu início ao nosso embarque foi saudado por vaias e pude ouvir com clareza de dois senhores bonitos em seus cabelos grisalhos, ao meu lado, as palavras gritadas de fdp.
Tive vontade de chorar! Muita vergonha alheia. Desta classe que, seguramente, se julga elite e que, para mim, é de terceira. |