(Frida Kahlo, 1939, As
Duas Fridas)
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Transplante de Útero.
Um avanço... só que
não!
por
Isabel Fomm de Vasconcellos, publicado na Revista
UpPHarma |
O X Congresso Paulista de Medicina Reprodutiva e a
I Jornada internacional de Especialidades da Sogesp (Sociedade de
Ginecologia do Estado de São Paulo) pareciam orgulhosos de receber os
médicos suecos Mats Brännström e Pernilla Dahm-Kähler, criadores da
técnica cirúrgica que permite o transplante de útero para mulheres
inférteis por problemas nesse órgão, ou pela ausência dele.
O primeiro transplante de útero, realizado por esses médicos suecos,
aconteceu em 2015 e foi descrito em outro congresso, realizado no
Exterior, além das inevitáveis publicações em revistas do meio.
Para esse primeiro transplante a doadora foi uma senhora de 60 anos e a
receptora, sua filha. Aqui em São Paulo, no HC da USP, também foi
realizado um desses transplantes, recentemente, em 2016, mas o órgão
doado veio de uma mulher com morte cerebral.
A diferença entre os dois transplantes aqui citados é bem grande.
Retirar um útero de uma mulher cadáver é uma coisa bem mais simples do
que retirar um útero de uma mulher viva e para transplanta-lo. Retirar
um útero para joga-lo fora (como no caso das muito frequentes
histerectomias realizadas) é também muito diferente de retirar um útero
para fazê-lo “funcionar” em outro corpo. Para transplante, essas
cirurgias de retirada de útero são muito mais complexas do que as
histerectomias onde o útero será descartado – assim me explicou, em
entrevista, o Dr. Artur Dzik, diretor do Serviço de Esterilidade
Conjugal do Hospital Perola Byington.
Bom, eu estou dizendo tudo isso porque, ao contrário do que possa
parecer, transplante de útero, para o meu modesto entender, é apenas uma
maneira de promover os médicos criadores da técnica e não um avanço na
Medicina. É claro que essa nova técnica causa comoção e curiosidade e é
tomada como um passo importante na solução de uma das questões da
moderna Medicina Reprodutiva. Mas eu vou dizer uma coisa, apenas para
você: SQN! Só que Não!
Muita gente anda se descuidando nas relações sexuais desprotegidas
porque pensa que a AIDS, agora que deixou de ser uma sentença de morte,
é um risco menor. SQN! Viver com AIDS significa viver com uma série de
restrições e tendo que tomar muitos medicamentos. A mesma coisa se
aplica aos transplantes. Um transplantado teve sua vida salva, ou sua
visão, ou sua função renal, devolvidas. Mas há um preço por isso. É
preciso tomar medicamentos contra a rejeição e sua vida não é tão
simples quanto se pensa.
No entanto, longe de mim negar o incrível avanço da Medicina ao
conseguir, via transplantes, salvar e recuperar tantas vidas.
A única coisa que questiono é: até que ponto se deve ir para que uma
mulher possa gestar um filho?
Até que ponto a maternidade é um mito cultural tão forte que gera
absurdos como esses transplantes de útero? Absurdos, sim. Completamente
sem razão de ser, posto que existem inúmeras outras alternativas que vão
desde a simples adoção (que é um gesto de amor e desprendimento) até a
popular “barriga de aluguel”.
A Medicina Reprodutiva hoje faz verdadeiros milagres. E consegue um
índice de sucesso bastante satisfatório. São milhões de bebês gerados
por fertilização in vitro no planeta. Óvulos e espermatozoides
congelados, útero de substituição (barriga de aluguel) e tantas outras
soluções disponíveis, até nos serviços públicos de saúde, tornam esse
transplante de útero uma técnica que realmente parece ter sido criada
muito mais para projetar seus criadores do que para resolver, com
humanidade e compreensão, problemas reais da saúde.
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