Acorrentadas aos Padrões
Uma das grandes escravidões da mulher é o seu corpo.
Em épocas mais remotas, nossas antepassadas tinham que ser gorduchas,
para estar dentro do padrão de beleza vigente. As musas dos grandes
pintores clássicos eram todas rechonchudas e cheias de gordurinhas
abdominais, com bumbuns avantajados, exatamente como hoje em dia ninguém
quer ser. Mas era o padrão.
Mais tarde, as elegantes tinham que estar espremidas em cruéis
espartilhos, amarrados por tiras de pano, nas costas, que as forçavam a
exibir uma silhueta de violão, com uma cinturinha de vespa. O que, quase
sempre, causava dores e outros problemas mais graves na saúde das nossas
tetravós.
Nos anos sessenta, época de uma juventude que lutava pela liberdade em
seu sentido mais amplo, as mulheres resolveram queimar sutiãs e parar de
depilar as axilas, como símbolo do resgate de seu próprio corpo. Elas
queriam ser donas, afinal, de seus corpos e já podiam, graças ao advento
da pílula anticoncepcional, exercer o controle de sua natalidade e
praticar o sexo sem o fantasma da gravidez indesejada. Mas foi apenas um
momento na longa história da escravidão dos nossos corpos.
Continuamos escravas. Logo veio à moda a imagem da mulher palito,
magérrima, os ossos das costelas e as saboneteiras aparecendo. O maior
exemplo dessa imagem era a anorética modelo Twigg. De lá para cá, ser
bela passou a significar ser magra. Muito magra. Está bom para as
nórdicas mas está mal para as brasileiras. Herdeiras de uma miscigenação
que nos fez, na maioria, dotadas de um corpo cheio de curvas e quase
sempre com quadris largos, nós passamos a vida na angústia de perder
alguns quilos, que, inevitavelmente, acabamos sempre recuperando, pois
assim a nossa natureza deseja, por mais que a tentemos contrariar.
Ora, somos escravas de mais essa!
O Peso Ideal X o Modelo Ideal
É claro que estar acima do peso não é nada bom para a saúde.
Obesos são vítimas, quase inevitavelmente, de doenças graves como a
hipertensão ou o diabetes. No entanto, os médicos, preocupados com a
saúde e não com a estética da moda, já declararam qual é o peso ideal
para a nossa saúde, através do cálculo do Índice de Massa Corporal
(IMC). É simples: divide-se o peso pelo quadrado da altura e o resultado
tem que dar abaixo de 25. Imagine agora uma modelo de 1,75m de altura,
pesando 50 quilos. Ela está abaixo do índice correto, que vai de 18 a
25. E, para a maioria das mulheres de hoje, quando essa conta resulta em
24 ou 25, elas se julgam muito acima do peso, embora estejam dentro da
faixa saudável.
No entanto, historicamente (como mostra com clareza o exemplo, acima,
dos espartilhos) a saúde sempre foi preterida. O que vence é o modelo.
E, por falar em modelo, as profissionais dos desfiles e poses, as
modelos, já estão proibidas, na Europa de 2015, de ostentar um IMC
abaixo de 18. Já é um avanço.
Emagrecer e Enlouquecer
Apesar dos avanços, perder peso ainda é uma obsessão para a
maioria das mulheres.
Basta ver o sucesso que fazem esses remédios “milagrosos” vendidos pela
Internet e pela TV e que, quando não fazem mal à saúde, também pouco ou
nada fazem que contribua para o emagrecimento. Muitos médicos também,
querendo ficar famosos e encher seu consultório, receitam
irresponsavelmente as tais “fórmulas” que misturam moderadores de
apetites com calmantes e até com hormônios e que, inevitavelmente, mexem
demais com o sistema nervoso feminino. Daí tantas loucas e histéricas
que vemos no dia a dia, no trânsito, nas lojas, no trabalho. Mulheres
que estouram à toa, perdem o controle, até com as crianças, têm ataques
histéricos injustificáveis, nem sempre estão sendo vítimas de Tensão Pré
Menstrual. Muitas delas estão sob o efeito de drogas. É, drogas mesmo.
Porque drogas não são apenas as ilícitas. Drogas são também essas
fórmulas para emagrecer que muitos médicos não hesitam em receitar.
Existem aquelas que se tornam, inclusive, completamente dependentes
dessas “bombas”. Ficam, sim, magras, mas também meio loucas...
Rios de dinheiro são gastos com a indústria do emagrecimento. E,
acredite, ninguém dá a menor bola para a sua saúde, física e mental,
nessa indústria.
Hoje, sem dúvida, há remédios sérios, fabricados por indústrias sérias e
receitados por médicos sérios. Sibutramina ou orlistat são exemplos
disso. Mas não devem ser usados sem a orientação de um bom médico
endocrinologista ou clínico.
Angústia e Sofrimento
Pior do que tudo isso é o caso das meninas que, de tanto fazer dieta, se
tornam bulímicas ou anoréticas. A anorexia pode levar à morte, não é
brincadeira. Cursa com a doença uma profunda distorção da imagem
corporal. Médicos contam casos de garotas pesando pouco mais de 30
quilos e ainda se dizendo gordas.
É um mundo de angústia e de sofrimento na perseguição de um corpo ideal.
E quem foi que disse que precisamos ter esse corpo ideal? Graças a Deus,
existem mulheres que escaparam dessa tirania. Existem gorduchas felizes,
bem resolvidas e bem-amadas. Por que não podemos, todas, nos livrar
dessa tirania da magreza? Por que continuamos escravas de uma imagem que
nos é imposta e que, quase sempre, contraria a nossa natureza?
É claro que obesidade é doença. Mas índice de massa corpórea beirando os
25 é normal e, com tal índice, todas nós nos julgaríamos gordas.
Por que continuamos a aceitar, em pleno século XXI, que a mídia nos diga
qual é o nosso corpo ideal? Por que não podemos nos revoltar contra
isso? Por que aceitamos mais essa manipulação, mais essa imposição?
Nós, brasileiras, não somos e jamais seremos esses varapaus que a moda
nos impõe. E estamos condenadas, aceitando e reforçando esse padrão de
mulher, a passar a vida frustradas, em dietas sem fim, em angústia sem
fim.
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