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(Magritte, 1944, Os Bons Presságios)

 

 

Pássaro Mensageiro

por Isabel Fomm de Vasconcellos

 

Sonhei, um dia desses, que um pássaro cor de rosa havia vindo do paraíso para abençoar a minha casa, o meu jardim e os meus amores. Era um pássaro maravilhoso, nem grande nem pequeno, e eu sabia que a presença dele em minha sala significava não só uma grande distinção, mas também um bom presságio.

 

 

Muito manso, ele me fazia seus carinhos, na maneira que os pássaros têm de fazer carinhos: pousava em meu ombro, roçava as lindas penas rosadas de suas asas em meu rosto e descansava suavemente no meu dedo indicador. 

 

Logo toda a imprensa, com sua parafernália de câmeras, gravadores e repórteres, estava plantada à porta da minha casa para me entrevistar sobre tão extraordinário acontecimento.

 

Era uma zorra tão grande que resolvemos organizar uma coletiva e fomos todos para um enorme salão onde se havia instalado uma mesa com microfones e uma confusão de perguntas foi despejada sobre mim. Então comecei a falar. E falava sobre todas as conquistas importantes que acumulei nessa longa vida que tenho vivido, falava sobre até onde me levaram os caminhos da tristeza ou da alegria, da conquista, da derrota, da esperança, da amargura, do desespero e da fé.

 

Um a um, lentamente, os jornalistas foram se desinteressando do meu discurso e abandonando a sala. Até que ficamos apenas o meu amor, eu e o pássaro.

 

- Vocês não entenderam nada! – gritei então para eles, que, apesar de já não estarem ali, eu sabia, podiam me ouvir. – Vocês são imediatistas, não entenderam aonde eu iria chegar.

 

Mas eles se foram e eu, por minha vez, compreendi, portanto, que o pássaro cor de rosa era apenas nosso, que viera para nós e não para o mundo.

 

Como num passe de mágica, estávamos de volta à sala de nossa casa e, empoleirado no travessão de nossas imensas janelas sobre a Avenida Paulista, o pássaro rosado cantava. As muitas plantas que cultivo irradiavam um brilho novo. E perfumavam, misturando seus aromas, o ar.

E o canto do pássaro falava de todos os momentos em que eu, emocionada, reconhecera, pela vida, na música, a voz do Universo.

 

quarta-feira, 10 de novembro de 2004                      19:42